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terça-feira, 1 de março de 2011

Anga Bhanga Sadhana


Por Rosana Biondillo

Hoje, já sabemos que esporte não é saúde. Pelo menos, o esporte profissional considerado de alto rendimento. Todas as modalidades esportivas de competição exigem demais de seus atletas, tanto no domínio físico, quanto no emocional e no mental. E – por que não dizer? – no espiritual também: quem não se lembra de ter assistido cenas em que atletas se concentram e rezam poucos minutos antes de uma competição importante?


Imagine-se, agora, treinando pesado uma média de seis horas diárias, monitorado por uma equipe multidisciplinar dizendo o tempo todo o que você deve fazer e como deve fazer. Imagine-se longe da família e dos amigos por semanas consecutivas. E imagine também as cobranças por desempenhos perfeitos e vitoriosos, sempre. Porque, sem hipocrisia, o que importa de fato no esporte profissional de alto rendimento não é bem competir, mas ganhar.


A esmagadora maioria desses atletas tem problemas de ordem física, especialmente os articulares, devido ao fato de estarem constantemente ultrapassando seus limites. Eles exageram demais na dose. E não vou aqui mencionar os casos comprovados de utilização de diversos medicamentos, para que esses mesmos atletas possam "suportar" toda a hipercarga de exigências, que vão muitíssimo além do ordinário. Infelizmente, essa é uma realidade assustadoramente crescente.


No cenário profissional, a coisa não é animadora, mas e no amador? Como será que andam as coisas entre os chamados "atletas amadores"?


Eu diria que piores, bem piores. Isso porque os atletas profissionais são exatamente isso: profissionais. Eles são bem remunerados para correr todos os riscos em nome de sua profissão, além de serem, como já disse, orientados e supervisionados por outros profissionais. Os atletas profissionais sabem o que estão fazendo e por que o estão fazendo. Já os amadores, na esmagadora maioria das vezes, não conhecem o alcance do que fazem, pois são leigos, embora possam ser bem-intencionados.


Além disso, comumente não são orientados e muito menos supervisionados; em contrapartida, aventuram-se a orientar outros nas mesmas condições. Essa é uma triste realidade que ronda academias, clubes, associações desportivas e, pasmem, estúdios de Yoga. A busca desenfreada por supostos ideais de perfeição não deixa ninguém nem nada de fora.


Devo confessar aqui, que algumas vezes chega a me dar um pouco de aflição quando um aluno chega até mim para perguntar como é que fulano de tal consegue fazer aquela postura tão acrobática, tão maravilhosa, tão mais isso e aquilo, como se o Yoga fosse tão somente isso e aquilo. Aí eu paro, respiro, ao invés de me entristecer eu me enterneço, olho e digo que se for anatomicamente possível e ele quiser, também vai conseguir fazer a postura, com muita paciência e ao seu devido tempo. Momentos como esse são importantíssimos para elevar a prática de Yoga a outro patamar, mais sensível e mais amoroso, onde a competição deveria ficar para os esportes de alto rendimento profissionais.


Hoje em dia, é muito comum praticantes sofrerem lesões em aulas regulares de Yoga. No entusiasmo do momento e na inconsciente necessidade de superar limites, os praticantes se transformam em atletas amadores. Nesse processo, o Yoga se transforma no que Krishnamacharya denominou Anga Bhanga Sadhana, isto é, uma prática que é benéfica para uma coisa e prejudicial para outra, na mesma proporção.


Segundo Krishnamacharya, correr, por exemplo, é um Anga Bhanga Sadhana, pois é uma prática benéfica para os sistemas cardiovascular e respiratório, porém é prejudicial para ossos e articulações. Ele dizia que correr é para cavalos, não para seres humanos, especialmente quando se corre em pleno calor do meio-dia, em meio à poluição e aos perigos de uma grande metrópole como São Paulo, por exemplo. Nesse caso, os benefícios empatam com os malefícios, anulando a prática. Em muitos casos, os malefícios chegam a superar os benefícios, tornando a prática contraindicada. Do mesmo modo, sua prática de Yoga deve ser boa para você, trazendo-lhe benefícios significativos. Quase nunca o que é bom para os outros é bom para a gente. Incluindo, especialmente, nosso Yoga Sadhana.


Minha sugestão é que deixemos os problemas para os atletas profissionais e amadores que escolheram esse caminho. Vamos usar de inteligência para que nossa prática de Yoga também não se transforme num Anga Bhanga Sadhana.


Rosana é professora e pode ser encontrada aqui:

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